
O Papel Social das Academias
Anos de testes conduzidos em ratos mostraram que, quando lhes era oferecido água misturada com cocaína ou morfina, os ratos experimentavam a água drogada e voltavam a ela como verdadeiros maníacos, até sofrerem uma overdose. E, assim como os humanos, os ratos são animais sociais.
Mas aqui um detalhe pouco conhecido destas experiências: os ratos nesses testes foram isolados e deixados sozinhos em uma gaiola.
Seguindo um palpite, um outro pesquisador criou um ambiente diferente que ele chamou de “Parque dos Ratos”. Era como um paraíso para ratos onde eles corriam livres, brincando, reproduzindo-se e fazendo atividades felizes em condições ideais para a espécie.
Assim que os ratos estavam aclimatados, este estudioso repetiu os testes anteriores de introdução de drogas alucinógenas. Nenhum rato sofreu uma overdose.
A maioria dos ratos nesse Parque dos Roedores experimentou as drogas misturadas na água, mas, ao contrário do que se esperava, nunca mais voltou a beber daquela fonte contaminada.

O que aprendemos e podemos aplicar em nossas vidas a partir dessas experiências?
Desde que emergimos de um ano tumultuado de lockdown, distanciamento social, relacionamentos virtuais conflitantes e polaridade de pensamentos induzida pela tecnologia, o consumo de drogas legais e ilegais aumentou entre a população, assim como a violência doméstica, a depressão e os suicídios, particularmente entre os jovens.
Os psicólogos acreditam que os humanos, não apenas os ratos, precisam fazer parte de uma comunidade, encorajados a se relacionar e experimentar o apoio de outras pessoas. E que essa carência é uma verdade psicológica básica.
É um fato que a satisfação psicológica de pertencer a um grupo é oriunda do nosso passado evolutivo nas tribos. Portanto, é mais um instinto natural do que uma “verdade” psicológica. E a responsabilidade individual pelas ações que tomamos em grupo não nos dá o direito de agredir o nosso corpo e o dos demais.
Por mais que façamos reuniões virtuais, sempre nos encontraremos pessoalmente uns com os outros porque buscamos comunidades reais de pessoas que trabalham entre nós e compartilham provações e desafios semelhantes aos nossos.
Nas lutas e no fitness não é o suor e os resultados que nos mantém treinando e motivados, são os relacionamentos com o instrutor e nossos parceiros de treinamento o que nos faz sentir vivos com essas conexões.
Desde os antigos gregos, as academias eram tanto um ginásio para a prática de atividades físicas vigorosas até um recanto de lazer, leitura e conversas filosóficas importantes. Esse tipo de interação física e intelectual estimulou o surgimento das academias modernas no final do século XX.
As academias nos curam da “Síndrome da Zona de Conforto”.
Não há negociação ou terceirização: ninguém ficará saudável no seu lugar por nenhum dinheiro do mundo. É uma impossibilidade física. Felizmente!
Muitos dos falsos confortos que vemos em nossa atual revolução tecnológica são uma continuidade da segunda revolução industrial do final dos anos 1800, tais como:
• Perda de autonomia mental e habilidades motoras outrora universais para a vida humana: cálculos mentais e escrita à mão se tornaram raridade;
• Perda de força física e vitalidade: vide os altos índices de obesidade infantil;
• Perda de virtudes como autossuficiência, perseverança e coragem: o senso crítico e de liberdade de pensamento para checar as fontes de informação passou a ser desestimulado em prol da notícia tendenciosa (Fake News).
Mais notavelmente, em todo o continente americano no final do século 19 cultivou-se um sentimento generalizado de ansiedade, juntamente com apatia e mal-estar, uma sensação de desinteresse pelo mundo misturada com inquietação e desejo por uma vida autêntica. Muitos se convenceram de que a vida moderna era muito rápida e complexa demais para nossa frágil psiquê tolerar.
A cura, eles acreditavam, era mais descanso e menos responsabilidade, porém a ociosidade e a alienação só pioravam a situação…
Uma contracorrente se desenvolveu a partir de pessoas que acreditavam que o problema era a ausência de desafios físicos e dos rituais de batismo e de passagem.
A perda de objetivos em comum, a falta de clareza nas comunicações e nos relacionamentos, as ambiguidades sociais e o mercado de trabalho encolhendo a cada ano fez a vida no mundo civilizado parecer vazia.
As pessoas começaram a sentir cada vez mais a necessidade de experimentar a alegria do esforço físico que gera endorfinas e outras substâncias de prazer e sentir sua vitalidade crescendo. Elas queriam se juntar a comunidades que reacendessem essa necessidade de suar a camisa em benefício próprio e dos demais.
Foi quando nasceram as academias modernas.
O treinamento físico e o atletismo cresceram em popularidade a medida que as pessoas buscavam sentir a camaradagem e a energia dos esportes de equipe. Por isso o apelo do futebol e dos estádios lotados de torcedores.
Academias, pistas de obstáculos e equipes esportivas tornaram-se faróis, atraindo o tipo de pessoa que ansiava por mais atividades e viver com mais autenticidade. A própria essência da academia é lutar contra as tendências negativas da sociedade que conspiram para nos transformar em versões inferiores de nós mesmos.
Essa ética natural está no cerne da contração dos músculos: a principal função do cérebro é coordenar movimentos visando a adaptação e sobrevivência.
Proprietários de academias de ginástica e todos que desejam fazer do fitness uma parte de seu estilo de vida podem se beneficiar ao lembrar dessas raízes evolutivas.
Hoje a padronização das academias e suas franquias está vendendo um tipo pasteurizado de fitness que é fácil de embalar e vender:
“Faça este programa e você ficará mais bonito na praia.”
“Venha para esta academia e você poderá usar todas essas máquinas chiques.”
Porém vale lembrar que aqueles ratos deprimidos que se tornaram viciados também tinham uma roda de caminhada e corrida para hamsters… (por isso você jamais encontrará uma esteira na Academia Imoto!).
Todos nós queremos ter uma aparência melhor, sentir e viver melhor. E a maioria das pessoas que passa em concursos e conquista diplomas, cargos e hierarquias nas empresas não atinge seus objetivos de preparação física.
Pergunte a qualquer gerente de academia qual porcentagem de seus membros aproveitou todas as aulas do plano escolhido no último mês. Mesmo aqueles que frequentam assiduamente uma academia geralmente anseiam por algo mais. As pessoas não querem apenas um plano de exercícios ou ganhar uma medalha; elas querem uma conexão legítima com seus semelhantes.
As pessoas querem autenticidade.
Em certos momentos também já fui obrigado a ensinar pela internet, mas é impossível ser autêntico enquanto se está treinando na frente de uma câmera.
Apenas nas academias você encontra os rituais em que todos podem se reunir sem distinção de raças e credos. Os ritos de passagem, do aluno iniciante ao avançado, são fases em que todos podem apoiar uns aos outros. Há uma filosofia, uma mentalidade e uma maneira de avaliar a si mesmo que gera confiança e motivação. E, mais importante ainda, há uma comunidade cujos membros estão reunidos por meio da presença física compartilhada.
Um famoso treinador veterano de fitness conta que sempre ficava surpreso com o cansaço dos atletas quando ele os levava para fora da academia e os colocava para jogar queimada, pegar a bandeira ou qualquer um dos jogos divertidos que foram essenciais na infância.
POR QUE NÓS, ADULTOS, PARAMOS DE BRINCAR?
O problema básico se resume à nossa cultura materialista: quando o jovem se torna adulto deve parar de brincar e começar a investir nos estudos e na carreira profissional séria.
Para contrariar essa cultura da seriedade, que transforma pessoas em robôs workaholics, as academias surgiram na sociedade para contrapor essas tendências culturais autodestrutivas.
Reservar um tempo para se cuidar torna pais e mães muito melhores como exemplo de vida saudável do que passar o dia comendo fast-food e a noite na frente de uma tela qualquer.
Se você deseja que seus filhos cresçam e vivam vidas extraordinárias, a melhor coisa que você pode fazer é ser o modelo para eles. Da mesma forma, se você quer melhorar sua vida, a melhor coisa a fazer é começar a agir.
Há muitos hábitos que valem a pena começar por conta própria, como projetos alimentares, rotinas de treinamento semanal, metas para dormir melhor e atingir tais e tais resultados de saúde e boa forma. Mas nada faz com que esses hábitos persistam mais do que ingressar em uma comunidade onde comportamentos altruístas já são a norma.